Quando a democracia sangra: deputados ameaçados de prisão nos EUA e no Brasil fazem motim para impor pautas bolsonaristas

Vemos os dois extremos de um mesmo dilema: como proteger a democracia de seus próprios atores?

Os Estados Unidos possuem uma das democracias mais antigas do mundo, erguida sobre pilares sólidos desde o século XVIII, e que, apesar das crises, mantêm mecanismos institucionais rigorosos para conter abusos. O Brasil, por sua vez, vive um cenário mais recente de consolidação democrática: apenas em 1985 encerrou um longo período de ditadura militar, dando início a uma redemocratização que ainda enfrenta desafios, especialmente na relação entre os poderes. Esse contraste histórico torna os episódios atuais, tanto nos EUA quanto no Brasil, ainda mais reveladores sobre como cada país lida com crises políticas dentro de seu regime democrático.

O episódio ocorrido em Washington, envolvendo o senador democrata Alex Padilla, traz à tona um debate essencial sobre os limites do poder e a resiliência das instituições democráticas. Padilla foi violentamente contido, jogado ao chão, algemado e retirado por agentes de segurança durante uma coletiva da secretária de Segurança Interna, Kristi Noem, após tentar fazer perguntas sobre a repressão aos protestos contra a política migratória do presidente Donald Trump. A cena, registrada em vídeo, gerou espanto e críticas.

  

Manifestação no Congresso Nacional Agência Brasil

   

O caso ilustra duas realidades inquietantes: a escalada autoritária nos Estados Unidos sob Trump e a fragilidade das regras de convivência entre poderes quando interesses políticos se sobrepõem ao diálogo democrático. A resposta do governo americano foi rápida e dura: agentes federais agiram sem hesitar para conter o senador, sob acusação de “teatro político”. Esse comportamento, embora questionável sob a ótica da liberdade parlamentar, reflete um padrão histórico nos EUA: desafiar a ordem pública, mesmo como autoridade eleita, pode levar à prisão.

Agora, façamos o paralelo com o Brasil. Em solo brasileiro, não faltaram episódios de insubordinação parlamentar — e até de tentativa de insurreição contra as instituições, como vimos em movimentos de bastidores para enfraquecer a presidência do Senado ou mesmo o Supremo Tribunal Federal. Aqui, atos de obstrução legislativa, como ausência para inviabilizar votações, são tratados como estratégia legítima de oposição, raramente gerando punições severas. Nesta terça-feira (05) pelo menos 12 senadores, aliados do ex-Presidente, fizeram protesto para pressionar o Presidente David Alcolumbre a pautar propostas bolsonaristas como: anistia total e irrestrita aos condenados no 8 de janeiro, impeachment de Alexandre de Moraes, fim do foro privilegiado. O movimento, claro, tem como pano de fundo a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro (PL).

Nos EUA, por outro lado, um ato semelhante pode resultar em prisão civil imediata, como demonstrado no Texas, onde deputados democratas enfrentaram ordens de prisão por boicotar uma votação sobre o redesenho distrital favorável a Trump. Essa diferença expõe um contraste brutal: o sistema americano, embora também marcado por tensões, aplica rigor contra quem desafia as normas regimentais, enquanto no Brasil, o jogo político é mais permissivo, mesmo diante de condutas que flertam com a quebra da ordem democrática. Pergunta-se: será que essa flexibilidade é sinal de maturidade ou de complacência?

O desafio é encontrar o equilíbrio. Democracias saudáveis precisam garantir espaço para o dissenso, mas sem tolerar atos que corroam as instituições. Quando um senador americano é algemado por tentar falar e parlamentares brasileiros fazem motim contra chefes de poder sem consequência, vemos os dois extremos de um mesmo dilema: como proteger a democracia de seus próprios atores?