Hoje em dia vemos cada vez mais as mulheres ocupando espaços que sempre foram vistos como pertencentes aos homens, como por exemplo o das forças de segurança. Lá nos anos 80, quando o preconceito não era nada velado e as oportunidades eram escassas, a jovem Elza Rodrigues Ferreira decidiu ir contra a mão da maioria da sociedade e ser policial militar do Piauí. Hoje, depois de décadas de luta feminina, Elza Rodrigues ocupa o posto de única coronel mulher do Piauí da ativa.
Em entrevista ao A10+, a coronel contou que na época de sua entrada na PM-PI, havia passado em dois concursos públicos, mas que optou em ingressar nos quadros da segurança pública do estado. Ela revelou que aquele era um ambiente predominantemente masculino e que os policiais ainda não sabiam ao certo como conviver com policiais femininas.
“Na época muito jovem me inscrevi em alguns concursos públicos e consegui ser aprovada em dois e escolhi a Polícia Militar. Foi muito desafiador ser policial militar porque é uma profissão que requer muita dedicação e é regida por normas e regulamentos baseada na hierarquia e disciplina. Além disso, na época era um ambiente masculino e nós chegamos nesse ambiente que eles não sabiam como seria essa convivência com as policiais femininas. E foi um trabalho de todas nós de conscientização, de mostrar a importância para todos eles do nosso trabalho, que nós estávamos ali para contribuir, para somar com a Polícia Militar do Piauí e com o trabalho da segurança pública”, explicou.
Coronel Elza possui um extenso currículo dentro da PM-PI, onde desempenhou diversos papéis, dentre eles o comando do 1ª Batalhão de Teresina e a Diretoria de Comunicação da PMPI. Além disso, ela também fez parte do Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças, onde o policial militar é formado. Ela contou que mesmo sendo um ambiente masculino, sempre foi muito respeitada.
“Sempre fui respeitada por todos, do soldado mais moderno ao policial mais antigo e nunca tive nenhum problema. Fui muito bem acolhida e sempre com uma meta de respeito. Ainda comandou também o 1º Batalhão, que é a área do centro da cidade e bairros adjacentes. Foi bastante prazeroso, foi gratificante, mas também é um trabalho que requer muita dedicação porque a nossa missão constitucional é de preservação da ordem pública e o policiamento ostensivo para dar segurança para as pessoas da nossa comunidade, da cidade do bairro”, contou ao A10+.
Coronel Elza ingressou na PM-PI aos 24 anos e recebeu sua primeira promoção como Sargento. Depois disso ela se tornou Aspirante, Tenente, Capitã, Major, Tenente-coronel e enfim, em novembro de 2021, 33 anos depois de dedicação às forças de segurança, Elza Rodrigues se tornou Coronel.
“Concluída essa missão do 1º Batalhão fui transferida para a diretoria de comunicação da Polícia Militar e trabalhei 4 anos. Foi um período de muito aprendizado porque você tem que acompanhar todas as atividades da instituição tanto na capital quanto no interior. E também foi um período muito feliz porque de lá eu fui promovida ao último posto da corporação. Fui promovida a Coronel e depois eu fui transferida para o comando de polícia comunitária”, falou, orgulhosa.
Hoje em dia, a Coronel Elza está à frente do Comando de Polícia Comunitária (CPCom), onde trabalha diretamente com a Patrulha Maria da Penha. Com muita experiência de bagagem, a coronel agora volta seus esforços justamente em prol das mulheres e dos grupos vulneráveis.
“O CPCOM é uma unidade que abrange o ciclopatrulhamento, o policiamento escolar, os pelotões mirins, o PROERD e a patrulha Maria da Penha. Estamos desenvolvendo esse trabalho da Patrulha Maria da Penha com foco na fiscalização das medidas protetivas de urgências para dar à mulher esse acolhimento, conscientizando da importância dela sair do ciclo de violência e que ela tenha uma vida digna e que ela seja uma mulher independente e feliz”, disse.
Coronel Elza apostou lá no começo nessa profissão e mesmo enfrentando muitos desafios fez dela a missão de sua vida. Hoje a coronel se sente totalmente realizada e feliz com a carreira que escolheu.
“São mais de 30 anos de Polícia Militar de trabalho, de dedicação, de motivação, de coragem. Trabalhei e trabalho diariamente todos os dias, acordo feliz e coloco minha farda e isso que é importante, você fazer o que gosta, fazer o que ama porque quando você faz o que ama, você faz bem feito e é isso que recomendo, oriento a cada pessoa a escolher sua profissão. Faça com amor, com carinho, porque tudo vai fluir na sua vida. Você vai ser uma pessoa feliz. E eu estou muito feliz por ter escolhido a Polícia Militar. Eu não me vejo sem a farda, ela me pertence e faz parte da minha pele”, finalizou.
Servir e proteger além da farda
Na área da segurança, são inúmeras histórias de vida de profissionais que se misturam com a missão da farda. Assim como Elza Rodrigues, a sargento Valdilene Brito, de 49 anos, esteve na Polícia Militar do Piauí por mais 30 anos. Hoje na reserva, a missão de servir e proteger permanece. A mulher é referência social na região da Grande Santa Maria da Codipi, na presidência da Associação Amigos da Sopa. O projeto distribui semanalmente alimentos para centenas de famílias carentes da zona Norte de Teresina.
Nas terças e quintas-feiras, ocorre a distribuição de sopas para pessoas em situação de vulnerabilidade social. O alimento é distribuído na sede da Associação Amigos da Sopa, localizada no bairro. Além disso, diariamente, verduras são fornecidas para famílias cadastradas.
“A sopa é para todo mundo, a sopa é para quem tem fome. A distribuição é feita às terças-feiras pela manhã e às quintas-feiras no turno da noite. O portão fica aberto, tem gente que leva para almoçar ou para jantar. E todos os dias as verduras são distribuídas. A Casa da Sopa também ajuda o CRAS e tem algumas famílias que nos procuram em situação de vulnerabilidade e nós buscamos oferecer a devida assistência e encaminhamento”, explica Valdilene.
A carreira militar e a missão social estão interligadas na vida da Sargento Valdilene. Foi durante mais um dia de patrulhamento ostensivo em Teresina que ela conheceu e ficou encantada com a associação, que tem um papel fundamental na região. Não demorou muito para a Valdilene contribuir com o projeto. Já são mais de 20 anos levando, diariamente, esperança para inúmeras famílias carentes na Grande Santa Maria.
“Eu ingressei na Polícia Militar em 1992, com 17 anos de idade. Influenciada pelos meus pais. Fiz o concurso e entrei na PMPI. Entrei como soldado, trabalhei na Companhia Feminina, no QCG, trabalhei na assistência militar da Prefeitura de Teresina e por fim, trabalhei no 13º BPM; local em que concluí a minha trajetória de 32 anos de polícia. Eu trabalhei também durante um tempo, realizando policiamento no aeroporto da capital. E um certo dia em 1994, nessa minha caminhada, através do pai dos meus filhos, eu conheci o idealizador da Associação dos Amigos da Sopa e me encantei pelo projeto. Em 2003 vim morar na Santa Maria da Codipi e aqui já existia a casa da sopa, e eu me identifiquei com o projeto e comecei a ajudar o Luís; o então mentor do projeto, distribuindo sopas às terças pela manhã e às quintas-feiras à noite. E também comecei a contribuir distribuindo verduras para as famílias cadastradas”, acrescenta.
Gratidão, esse é o sentimento que a Valdilene cultiva em relação a PMPI. Mesmo aposentada, ela enfatiza que tudo o que aprendeu servindo a corporação é agregado diariamente à frente da Associação Amigos da Sopa.
“E eu agreguei a missão de policial militar à função social. Me aposentei dia 11 de janeiro deste ano. E hoje dedico a minha vida a associação dos amigos da sopa e a casa da sopa. Hoje estou de coração aquecido porque foi através da PM que eu me sustentei e sustento os meus filhos. A PM abriu as portas para tudo que construí até hoje. Tenho muita gratidão também ao professor Luis Santos, essa parte social da minha vida. Pois ele me deu essa oportunidade de estar aqui hoje. A Polícia Militar e o social caminham juntos na minha vida. E acho que, mesmo fazendo parte da reserva, ainda não encerrei a minha carreira militar por que ainda me sirvo da PM”, finaliza.