A Cúpula do G20, que reúne as maiores economias do planeta, terminou na terça-feira (19), no Rio de Janeiro. Após quatro anos sem consenso entre os países, a declaração final foi assinada por todos os líderes, que firmaram o compromisso de combater a fome e as mudanças climáticas. O documento também tem tópicos sobre conflitos, governança global e taxação de super-ricos.
Os Estados Unidos, maior economia do mundo, foram um dos países que encararam as propostas apresentadas durante as reuniões como positivas e aderiram ao acordo, que foi assinado pelo presidente Joe Biden.
A participação do democrata foi uma das últimas ações de seu governo, que chega ao fim no dia 20 de janeiro de 2025, quando Donald Trump tomará posse da Casa Branca. Sob o comando do republicano, os EUA serão anfitriões do G20 em 2026, após o evento passar pela África do Sul no ano que vem.
O R7 conversou com especialistas para entender qual é o futuro do G20 em relação aos Estados Unidos e o que acontece com o acordo assinado por Biden no Brasil, visto que ele deixará de ser presidente em breve.
Trump pode quebrar o acordo do G20?
Segundo os especialistas, a possibilidade existe. Isso é cogitado a partir da divergência entre as ideologias de Trump e as propostas estabelecidas pelo Brasil no evento. Segundo a professora de relações internacionais Natali Hoff, a promessa do republicano de retirar o país do Acordo de Paris novamente é algo que pode contribuir para o rompimento com o combinado no G20, que defendeu, neste ano, a agenda de combate às mudanças climáticas.
“É possível que esse e outros pontos do acordo não sejam cumpridos pela gestão de Donald Trump, já que essa é uma gestão que pretendia romper com o fomento dos EUA às instituições multilaterais”, diz.
Ela também explica que o governo de Trump tem um posicionamento mais nacionalista e isolacionista, o que significa uma valorização do próprio país e um afastamento das outras nações em aspectos diplomáticos e culturais. Isso foi um dos motivos que dificultou a formação de um consenso entre os países nas cúpulas anteriores do G20, de acordo com a professora.
Apesar disso, a rejeição das pautas decididas entre os líderes pode prejudicar o país no âmbito diplomático. O doutor em relações internacionais pela UnB (Universidade de Brasília) Guilherme Frizzera afirma que é improvável que os Estados Unidos rejeitem completamente os compromissos firmados no G20, pois isso prejudicaria a reputação internacional.
“Como a maior potência global e um dos pilares da ordem internacional baseada em regras, sua liderança em uma postura anti-acordos coletivos poderia enfraquecer a legitimidade do G20 e comprometer iniciativas globais em áreas críticas como mudanças climáticas, comércio e segurança”, complementa.
Posicionamento no G20 de 2026
Em 2026, a África do Sul passará o bastão para os Estados Unidos, que se tornará o anfitrião do G20. Como o país será responsável por encabeçar algumas das pautas que serão discutidas pelos líderes no ano em questão, o R7 questionou se seria possível antecipar alguns dos tópicos com base no estilo de governo de Trump e nas promessas de campanha enquanto candidato.
O especialista em direito público Tiago Oliveira afirma que seria difícil prever quais metas Trump deve anunciar, mas pontua que a pauta climática deve ser debatida com menos força. Segundo ele, o país é contra a burocracia internacional e prefere acordos bilaterais, ao contrário dos países europeus, que prezam por acordos multilaterais e aderem mais facilmente a combinados, como o do G20.
“Trump faz o compromisso com a deportação em massa de imigrantes, o que é uma preocupação do G20. Tudo aquilo que o mundo está tentando aliviar a tensão é pauta contrária àquilo que ele prega. Os EUA não gostam de ingerência internacional em seu governo”, completa.
Essa ideia é reforçada por Fizzero, que enfatiza a “aversão ao multilateralismo e possível desdém por compromissos globais de longo prazo”. De acordo com ele, a agenda americana deve privilegiar questões sobre comércio justo sob uma visão protecionista e questões climáticas voltadas para o setor energético estadunidense.
“Adicionalmente, temas como segurança internacional, imigração e combate ao crime organizado podem ser destacados, mas com um viés que reforça a narrativa de segurança fronteiriça e soberania nacional, característicos do governo Trump”, afirma.
Como isso afeta o Brasil?
Hoff afirma que a expectativa para os próximos anos é de uma estagnação no G20 por causa da falta de consenso que os EUA podem trazer para a mesa. Segundo ela, isso é negativo para a forma como o Brasil busca se portar nas relações internacionais.
“O Brasil busca se portar por meio do enfoque nessas instituições de relacionamentos multilaterais. Com a estagnação desses fóruns, a diplomacia brasileira precisa navegar por águas mais tortuosas nos próximos anos, porque vai ser difícil defender os interesses da gente”, diz.
Oliveira aponta que, quando Trump tomar posse, os EUA podem não fazer esforços para completar as metas globais, principalmente relacionadas ao clima, e isso pode afetar diretamente o Brasil e as políticas de redução do desmatamento da Amazônia.