Blogueiras ostentavam e lucravam com a perda de dinheiro dos seguidores no ‘Jogo do Tigrinho’ no Piauí; saiba como funcionava o esquema

Elas teriam movimentado cerca de R$ 10 milhões no esquema. Sandálias, bolsas e viagens caras seriam bancados com esses valores

Nas redes sociais uma vida de ostentação de artigos de luxo e viagens internacionais bancados com o prejuízo dos próprios seguidores. É o que revela a Polícia Civil sobre as blogueiras alvos de operação que atuavam com a divulgação de plataformas de apostas, conhecidas popularmente como "Jogo do Tigrinho", na cidade de Parnaíba, litoral do Piauí.

As investigações apontam que as influenciadoras teriam movimentado cerca de R$ 10 milhões com as divulgações. Elas foram identificadas como Thaisa Costa Machado (594 mil seguidores), Tereza Iva Gomes Freitas (128 mil seguidores) e Emília Magalhães Brito (93,2 mil seguidores). A apuração bancária iniciou, em julho do ano passado, com análises de dados a partir do ano de 2021.

  

Blogueiras ostentavam e lucravam com a perda dos seguidores no jogo do Tigrinho no Piauí; veja detalhes da operação Reprodução/Redes Sociais

   

Segundo o delegado Ayslan Magalhães, em entrevista coletiva, as influenciadoras faziam parcerias através do seguinte tipo de proposta de pagamento: um salário fixo e a quantia de 40% dos valores referentes a perdas de cada seguidor que usasse o link divulgado que direcionava para a plataforma. "Elas divulgavam em parceria com essas plataformas, e auferiam valores financeiros a partir da perda dos seguidores. Colocavam o link nos stories, e a partir do momento que aquele seguidor jogava, investia, e perdia o dinheiro, 40% desse valor era direcionado para essas influenciadoras", afirmou.


Os valores compartilhados como ganhos pelas blogueiras, segundo a polícia, eram falsas montagens. "Elas mentiam que estavam ganhando dinheiro. Descobrimos que aquelas postagens que elas diziam, que ganhavam determinado valor, a investigação bancária identificou que aquele valor era falso, não existia, era uma montagem", reforçou o delegado.

Ayslan também detalhou que a maioria dessas empresas envolvidas não tem sede fixa e o capital social é incompatível com os valores pagos aos influenciadores cooptados. Diante das análises sobre esses ativos, a PC-PI já trabalha com a possibilidade de futuras operações com a colaboração das polícias do Rio de Janeiro e São Paulo, onde estariam essas empresas. "São aproximadamente 90 empresas, todas com sede fora do estado do Piauí.  Avaliamos uma nova operação e vamos depender da colaboração da PC de SP e RJ. A maioria é empresa fantasma, não existe sede fixa, e capital social baixíssimo de R$ 10 mil, e paga um milhão de reais, é totalmente incompatível", explicou o delegado.

Com os elementos verificados durante o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, novos influenciadores, até mesmo de Teresina, também serão intimados para esclarecimentos. "Vamos intimar essas pessoas que receberam a mesma oferta [salário fixo+ 40% pela perda]. As plataformas tentam captar esses influenciadores que têm muitos seguidores, e demonstram como funciona o esquema, o que eles chamam de Baú", explicou.

Bens apreendidos poderão ser leiloados

A Polícia Civil destacou a quantidade de artigos de luxo apreendidos, como sandálias e bolsas, que variam de R$ 5 mil a R$ 28 mil, além de veículos em nomes de terceiros. Eles serão avaliados para possível leilão. 

"Vamos representar pela avaliação de cada bem, que deverá ser leiloado judicialmente, e depositado em contas judiciais. São bens vultuosos, que não fazem parte da nossa realidade, o oficial de justiça vai avaliar cada um, até mesmo para saber se é algo original ou falsificado", explicou.


Abertura de empresas

Duas das suspeitas da operação abriram recentemente lojas de maquiagem. Segundo Ayslan Magalhães, esses ativos também serão analisados no contexto do que se pode caracterizar como lavagem de dinheiro. "Elas obtiveram dinheiro de forma ilícita, a partir do Tigrinho, e elas precisam dá aparência lícita para esse dinheiro. Uma das formas de lavar o dinheiro, é converter esses ativos com aberturas de empresas, elas abriram lojas de maquiagem para poder justamente tornar esse ativo de forma lícita", disse.

As equipes de investigação identificaram uma incompatibilidade entre a ostentação nas redes sociais e do material apreendido com os valores lícitos apresentados por elas. O caso, segundo o delegado, poderá se estender para uma apuração também sobre sonegação fiscal. "A ostentação nas redes sociais, com as viagens caras, são incompatíveis com a renda lícita. Inclusive, podem ser investigadas por sonegação fiscal, para apontar se declararam esse dinheiro ou não", detalhou.

Não foram presas, mas deverão cumprir medidas cautelares

O delegado descreveu que as medidas cautelares impostas estão relacionadas à proibição para divulgar plataformas de apostas, sequestro de bens e valores em conta, proibição de se ausentar do Piauí sem autorização judicial, além da entrega de passaportes. "Se descumprirem as medidas cautelares, poderemos representar pelas prisões", alertou.

As redes sociais das investigadas não foram desativadas. "Elas podem falar da operação, podem criticar, isso faz parte da liberdade de expressão, o que não podem fazer é divulgar o Tigrinho, e coibir as pessoas de não virem registrar BO, sob pena de caracterizar coação no curso do processo, e seria outro crime e ter sua prisão preventiva decretada", destacou.

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O delegado Ayslan Magalhães informou que no momento de um mandado de busca, uma influenciadora que se candidatou à vereadora na cidade, afirmou que a ação se tratava de uma perseguição política. "Não existe cunho político, falamos de fatos antes mesmo da eleição do ano passado", ressaltou. 

As influenciadoras poderão responder por estelionato, lavagem de dinheiro, organização criminosa, divulgação de loteria não autorizada e indução do consumidor ao erro. O nome da operação faz referência à deusa romana Laverna, associada ao submundo, ladrões e atos ocultos, representando o caráter dissimulado das práticas investigadas.

Se sente vítima? Saiba o que fazer

A Polícia Civil recomendou que quem se sentiu lesado por uma das envolvidas deverá procurar a unidade policial. "Pessoas que se sentiram lesadas, ludibriadas, enganadas, devem ir à delegacia registrar BO contra elas", pontuou.