“O que farei agora?”, questionou Rosana Melo ao descobrir, aos 19 anos, que estava grávida de gêmeos, justamente enquanto cursava a graduação em História. Hoje, aos 34 anos, formada em Serviço Social pela Universidade Federal do Piauí (UFPI) e dividindo seu tempo entre a família e a residência, ela recorda tanto as alegrias quanto as dificuldades da maternidade. Apesar dos desafios enfrentados, Rosana afirma que não mudaria nada em sua trajetória.
Rosana Melo, mãe dos gêmeos Samuel e Gabriel, hoje com 14 anos, compartilhou com o A10+ neste Dia das Mães a sua trajetória marcada pela maternidade solo, pelas renúncias e pelos desafios de conciliar os estudos, o trabalho e a criação dos filhos. Durante essa jornada, ela enfrentou a rotina de dois estágios simultaneamente, as aulas na universidade e, naturalmente, os cuidados com os meninos. Hoje, Rosana recorda cada passo dado até se transformar na profissional e na mãe que é atualmente.
“Bom, eu cursava História, acho que estava no segundo ano, e aí me deparei com a gravidez aos 19 anos. Foi uma gravidez conturbada, um período difícil, até de aceitação. Acabei deixando o curso para me dedicar aos meninos. Sempre gostei de estudar, então, mesmo com as dificuldades, resolvi tentar de novo. Fiz o Enem, entrei em Serviço Social e comecei a construir minha trajetória, com uma rede de apoio pequena, mas essencial, meu irmão e minha vizinha me ajudavam com os meninos.”
Instinto materno
O sentimento de culpa, por vezes, a dominava, mas foi justamente a maternidade que lhe trouxe a força necessária para seguir em frente. “Ser mãe já é muito difícil. Mesmo quem tem esposo geralmente carrega a maior parte da responsabilidade. No meu caso, tudo pesava mais. Tinha colegas que me davam apoio emocional, e fui me fortalecendo com minha família. Mas não é só doce, não. A maternidade tem amor, afeto, carinho, mas também tem agruras.”
A aprovação em dois estágios, um deles remunerado, no Tribunal de Justiça, trouxe novas cargas. Ela precisava conciliar o expediente no tribunal com outro estágio no CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) e, à noite, as aulas na UFPI. Chegou a se sentir exausta, mas não recuou. Em diversos momentos, relata, seguiu o instinto materno.
“Teve um momento muito marcante, que foi quando meu filho Samuel teve apendicite. Ele tinha 10 anos e fui à emergência. A médica disse que era virose, mas eu insisti. Eu sabia que não era. Pedi o exame, ela fez só porque eu insisti. Quando saiu o resultado, ele estava com apendicite aguda. Se eu não tivesse confiado no meu instinto, ele poderia ter morrido. Aquilo me marcou profundamente.”
Bilhetinhos
Rosana também lembra com emoção dos bilhetes carinhosos que os filhos deixavam em datas especiais, como no dia em que ela fez seu primeiro plantão na residência. Essas palavras de incentivo e a gratidão dos meninos foram a motivação que ela precisava para seguir avançando na carreira.
“O maior ato de amor que fiz foi continuar a gravidez mesmo sabendo tudo que viria pela frente. Abdicar do meu curso, doar minha vida a eles. E sigo doando. Acho que todas as mães fazem isso de alguma forma. E o que recebo deles em troca são esses momentos de carinho, os bilhetes, os abraços quando chego cansada, o orgulho que dizem sentir de mim. Isso me move.”
Ela reconhece que, se tivesse tido mais apoio psicológico à época, como terapia ou acompanhamento psiquiátrico, poderia ter lidado melhor com as transformações emocionais e físicas que a maternidade trouxe. Na vida profissional, ela leva a experiência da maternidade como instrumento no atendimento social.
“Amor, dedicação, empatia, escutar o outro. Ser acolhedor. A maternidade me ensinou tudo isso. E entendi que a nossa vida é um processo. A gente não nasce sabendo ser mãe, nem profissional. A gente vai aprendendo. Vai vivendo, tropeçando, caindo e levantando. Mas sempre seguindo.”
Rede de apoio
Como profissional que reconhece o peso de ações governamentais na vida social, Rosana reprovou a escassez de políticas públicas para a variedade de maternidades existentes, e trouxe uma reflexão para mulheres que lidam com situações semelhantes.
"A minha realidade é uma, a realidade das outras [mães] é outra. Há muitos contextos diferentes. O ideal é que a gente tivesse políticas que assistissem essas mães. Nós mulheres sentimos muita falta disso e é preciso mudar. As políticas públicas têm que enxergar a mulher com a sensibilidade e o compromisso que a situação exige, como uma rede de apoio. O essencial é que tivesse uma rede de apoio e sabemos que nem sempre contamos com isso. Nós, mães, não podemos nos culpar, temos de entender que também nós mulheres somos ainda muito não vistas pelas políticas, e pelos homens que fazem as leis".
Volta no tempo
É inegável que a maternidade tem sua beleza única, mas também traz consigo desafios e conflitos próprios desse período. Com os olhos marejados e uma emoção tão intensa que atravessava até a tela que nos separava, Rosana Melo abriu o coração e afirmou, sem hesitar, que não se arrepende de nada. Foram justamente as dificuldades que a moldaram na mulher, mãe e profissional que se tornou hoje.
“Eu não voltaria atrás. Tudo que eu sou hoje é fruto dessa construção, de eles terem nascido. Os meninos me renasceram. Foi doloroso, foi trabalhoso, mas me construiu. É bom saber que eu tenho eles. Hoje, eles são minha continuidade, o fruto que eu tô plantando no mundo", finalizou.