Em entrevista exclusiva à jornalista Christina Lemos, do Jornal da RECORD, nesta quinta-feira (10), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou duramente a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros e classificou a atitude como “desrespeitosa”.
Lula anunciou que vai criar um comitê para acompanhar a situação entre Brasil e Estados Unidos, em recado direto aos empresários.
“Vamos criar e os empresários vão participar. A gente vai acompanhar dia a dia e repensar a política comercial com os americanos”, afirmou.
Ele também acusou Trump de desconhecer a realidade comercial entre os dois países e afirmou que o Brasil tomará medidas com base na Lei da Reciprocidade.
“A primeira coisa que o povo brasileiro precisa saber é que quem tem que respeitar o Brasil e gostar do Brasil são os brasileiros. E, ao mesmo tempo, exigir que os outros nos respeitem”, afirmou Lula.
Segundo o petista, “o Brasil é um país em que tudo se resolve na conversa”.
“Mas eu achei aquela carta do pretendente – porque ele não é presidente, é pretendente – absurda. Não é costume ficar mandando recado por rede social para um chefe de Estado”, continuou.
Em tom firme, Lula mandou um recado direto:
“Respeito é bom, e eu gosto de dar e gosto de receber. Não pensem que temos complexo de vira-lata. A gente não tem medo. Claro que estamos preocupados com o Brasil, mas também com os Estados Unidos. Trump fala para o eleitorado dele, mas eu penso no povo brasileiro, que quer crescer, melhorar de vida, e ter relações boas com todos os países.”
Desconhecimento do Brasil
O brasileiro acusou Trump de demonstrar profundo desconhecimento sobre o Brasil.
“Se ele conhecesse um pouco do Brasil, teria mais respeito. O Brasil tem 201 anos de relação diplomática com os Estados Unidos, uma relação virtuosa, de benefício mútuo. Eu me dei bem com todos os presidentes americanos, porque o Brasil é um país de diálogo.”
Lula rebateu ponto a ponto os argumentos de Trump na carta enviada ao Brasil. Confira:
Sobre a soberania e a Justiça brasileira:
“Eles têm que respeitar o nosso Judiciário como eu respeito o deles. Se o que Trump fez no Capitólio tivesse acontecido aqui, ele estaria sendo processado como o Bolsonaro e poderia até ser preso. Aqui, o Judiciário é autônomo, sobretudo o STF.”
Sobre plataformas digitais e empresas americanas:
“Quem estabelece as regras no Brasil é o Congresso Nacional e o Judiciário. Nenhuma empresa estrangeira pode vir aqui e ignorar nossas leis. Trump precisa entender isso.”
Sobre comércio exterior:
“Ele alega que os Estados Unidos têm déficit com o Brasil, mas isso não é verdade. Em 2023, exportamos US$ 40 bilhões e importamos US$ 47 bilhões dos EUA. Tivemos um déficit de US$ 7 bilhões. E se somarmos os últimos 15 anos, o Brasil acumulou um déficit de US$ 410 bilhões com os americanos. Será que ninguém do Tesouro explicou isso pra ele antes de escrever aquela carta absurda?”
Campo diplomático e comercial
Lula afirmou que, diante da medida, o Brasil tomará providências no campo diplomático.
“Temos vários caminhos. Podemos recorrer à OMC (Organização Mundial do Comércio), propor investigações internacionais, cobrar explicações. Mas o principal é a Lei da Reciprocidade, aprovada no Congresso. Se ele cobrar 50% da gente, a gente vai cobrar 50% dele.”
O presidente também criticou o ex-presidente Jair Bolsonaro e seu filho, deputado Eduardo Bolsonaro, por supostamente atuarem para incentivar Trump a retaliar o Brasil.
“O ex-presidente deveria assumir sua responsabilidade. Foi o filho dele quem foi lá influenciar Trump, que agora tenta interferir em um processo que está na Suprema Corte brasileira. E aqui, decisão judicial se cumpre.”
Confira a entrevista no Jornal da RECORD, a partir das 19h55.
Entenda
O confronto entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Donald Trump levou o norte-americano a anunciar uma tarifa de 50% sobre todos os produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos, com início previsto para 1º de agosto.
Adversários ideológicos, os dois chefes de Estado reacenderam a tensão após recentes episódios envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e a cúpula do Brics, realizada no Brasil.
Na quarta-feira (9), Trump enviou uma carta a Lula informando a medida. Segundo o presidente norte-americano, trata-se de resposta a supostos ataques do Brasil à liberdade de expressão de empresas dos Estados Unidos e ao tratamento dado a Bolsonaro.
Ainda na quarta, o governo avisou que vai devolver a carta. A embaixadora Maria Luisa Escorel, secretária de Europa e América do Norte, comunicou ao encarregado de negócios Gabriel Escobar, chefe da embaixada dos Estados Unidos em Brasília, que Lula não receberia a carta, divulgada informalmente por Trump na rede Truth Social.
De todo modo, antes disso, Lula publicou em uma rede social que “qualquer elevação de tarifas de forma unilateral será enfrentada conforme estabelece a Lei da Reciprocidade Econômica”.
”Soberania, respeito e defesa dos interesses do povo brasileiro orientam nossa política externa”, afirmou o presidente.