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O Brasil é o oitavo país que mais polui os mares com plástico no mundo. Por ano, são cerca de 1,3 milhão de toneladas de resíduos plásticos jogados nos oceanos, o equivalente ao peso de 1,3 milhão de carros pequenos. À frente do Brasil estão Filipinas, Índia, Malásia, China, Indonésia, Myanmar e Vietnã.
O levantamento é da ONG Oceana e foi publicado no relatório “Fragmentos da Destruição: Impacto do Plástico à Biodiversidade Marinha Brasileira". A poluição não afeta apenas o litoral, segundo o estudo, visto que 98% dos peixes amazônicos pesquisados tinham plástico ou microplástico no intestino e nas brânquias (órgãos respiratórios de animais aquáticos).
Os dados também revelam que 49 das 99 espécies de aves, répteis e mamíferos analisados pelo Projeto de Monitoramento de Praias tinham plástico no estômago.
O analista de campanhas da Oceana, Iran Magno, ressalta que um mar saudável pode oferecer uma refeição saudável de pescados a 1 bilhão de pessoas todos os dias. Para isso, contudo, ele diz que o ecossistema deve estar em equilíbrio.
Para ele, o Brasil precisa avançar, com urgência, na busca de soluções para a crise global do plástico. “Somos um país de dimensão continental, com mais da metade da população vivendo em áreas costeiras e uma produção anual de plásticos de uso único de 2,95 milhões de toneladas”, observa.
Para Magno, o desafio é acabar com a quantidade de itens descartáveis e embalagens plásticas que são rapidamente jogadas no lixo após serem abertas.
“Ocuparmos o 8º lugar no ranking dos maiores poluidores evidencia que precisamos olhar para a origem do problema, que é o nosso modelo linear de produção de plástico, e deixar de apenas tentar remediar os sintomas da poluição no ambiente. Discutir a solução com esse olhar para toda a cadeia é algo que ainda temos falhado no Brasil”, afirma.
O que pode ser feito?
O especialista avalia que é necessário fechar a torneira de produção do plástico do Brasil. Ele sugere a implementação de uma economia circular do plástico.
Atualmente, um projeto de lei (PL 2524/2022) tramita no Congresso e propõe medidas que reduzem a produção dos plásticos descartáveis e estabelece iniciativas para que todo o plástico que for produzido no país tenha características adequadas para a reutilização, a reciclagem efetiva ou a compostagem, evitando que eles virem resíduos e se acumulem no ambiente.
“Esse projeto está estacionado na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado e precisa avançar. Vale ressaltar que as soluções propostas pelo PL 2524/2022 estão alinhadas com as melhores práticas internacionais para enfrentar essa crise global de forma eficiente”, defende.
O especialista também diz que não basta a ação individual. Magno pontua que há décadas tem sido plantado no imaginário da sociedade que os hábitos e as escolhas singulares e pessoais seriam capazes de reverter esse cenário da poluição por plástico.
“Para muito além da responsabilidade do consumidor, é preciso que o Poder Público assuma um papel de liderança e direcione o país rumo a uma transição que, de fato, reduza os plásticos problemáticos e promova alternativas”, comenta.
Danos ao meio ambiente
Magno explica que o plástico é um material leve, facilmente carregado pelo ar e pela água — o que faz com que ele esteja presente em todos os lugares. Ele ainda se fragmenta em pedaços cada vez menores e dá origem aos microplásticos, encontrados em todos os níveis da cadeia alimentar da biodiversidade marinha e representam uma grave ameaça à saúde de diversas espécies.
“Mais de 200 espécies marinhas já foram registradas com ingestão de plástico no Brasil, incluindo tartarugas, aves, mamíferos, peixes, crustáceos, moluscos, corais e plâncton”, explica.
Professora e pesquisadora no Departamento de Química Analítica e Físico Química da UFC (Universidade Federal do Ceará), Carla Bastos Vidal alerta que a poluição causada pelo plástico é hoje uma das maiores ameaças ambientais do mundo, ficando atrás apenas da crise climática.
Ela alerta que os microplásticos também se originam de fontes diversas, como produtos de higiene pessoal, tintas, resíduos de pneus liberados por atrito nas rodovias e fibras sintéticas das roupas.
“A maioria desses resíduos acaba nos oceanos, representando um risco grave aos ecossistemas aquáticos, uma vez que essas partículas são ingeridas de forma involuntária por animais marinhos”, detalha.
Segundo Bastos Vidal, nove das 10 espécies de peixes mais consumidas no mundo contêm plástico em seus organismos. Ela frisa que isso afeta a cadeia alimentar e traze riscos diretos à saúde humana. “Estudos mostram que uma pessoa pode ingerir entre 0,1 e 5 gramas de plástico por semana — o equivalente ao peso de um cartão de crédito”, pontua.
Mudança de perspectiva
A professora explica que, no cenário global, o último relatório do Programa Ambiental das Nações Unidas, publicado em 2023, propôs estratégias e identificou desafios para reduzir a poluição plástica até 2040.
“O principal obstáculo para essa redução é tornar o mercado de reutilização e reciclagem de plásticos mais lucrativo do que o de plásticos de uso único, uma vez que a cadeia produtiva do ‘descartável’ [usar e descartar] ainda é economicamente mais vantajosa que a implantação de processos e políticas de reciclagem e reutilização”, observa.
Bastos Vidal reforça a importância de uma legislação para definir algumas dessas estratégias, como é a proposta do PL 2524/2022.
“No Brasil, maior produtor de plástico da América Latina, ainda não há uma legislação específica contra a poluição plástica que apoie a economia circular. Esse modelo prioriza o uso sustentável dos recursos naturais e a eliminação de resíduos e poluição, desde o design do produto até sua comercialização. Após o uso pelo consumidor, o produto e seus materiais retornariam às cadeias produtivas para novos ciclos de vida, evitando o descarte”, explica.
“Embora o projeto de lei seja crucial, ele precisa ser acompanhado de medidas econômicas concretas que tornem o mercado de reutilização e reciclagem de plásticos mais rentável que o de plásticos descartáveis”, finaliza a professora.
Fonte: R7