Piauí possui 6.275 terrenos de marinha que podem ser privatizados se aprovada a PEC das Praias

Advogado da União contradiz o Senador Flávio Bolsonaro que tenta um lobby para beneficiar grandes empreendimentos

Sim, se aprovada a chamada PEC das Praias estará aberta a real possibilidade de privatizar espaços públicos em todo o país. Quem afirma, com exclusividade ao Blog Bastidores, é Luís Fernando Teixeira Canedo, Advogado da União e Coordenador Adjunto da Coordenação de Patrimônio e Meio Ambiente da 1° Região (que engloba o Estado do Piauí). A informação acaba sendo um contraponto ao relator da matéria, Senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) que nega ser esse o objetivo.

De acordo com a Secretaria de Patrimônio da União, o litoral do Piauí possui 6.275 terrenos de marinha, sendo apenas oito ocupados pela administração pública e a grande maioria, 6.247 cedidos a terceiros, ou seja, casas e mansões na orla da praia e/ou empreendimentos privados, como hotéis e resorts, bares, etc. No entanto, a área continua da União e, desta forma, os ocupantes têm que pagar uma espécie de aluguel. 

Piauí possui 6.275 terrenos de marinha que podem ser privatizados se aprovada a PEC das Praias
 

   

Sobre esses aluguéis, o Senador Flávio Bolsonaro usou as redes sociais para justificar a Proposta de Emenda à Constituição e politizou o caso, afirmando que é uma “narrativa da esquerda”. Para ele, o pagamento de taxas são coisas absurdas.

“Aquelas terras que estão desocupadas hoje em dia e que são terrenos da União isso não trata na PEC. A PEC trata das propriedades ocupadas, dos imóveis ocupados naquela faixa de terra perto da praia que é dita os terrenos de marinha. O que a PEC fala é que: não quero mais que o povo pague aluguel para o Governo Federal. Isso é a taxa de foro, que é 0.6% pago todo ano e que nada mais é do que um aluguel. Tem algum sentido isso hoje continuar? No meu entendimento, não. Paga também o laudêmio. Você pagar para o Governo Federal para que ele autorize você a passar o domínio dessa área para outra pessoa, 5% de laudêmio. Qual o sentido disso? Hoje é possível que grandes empreendimentos sejam autorizados a funcionar em toda a nossa orla brasileira (…) Agora, não pode proibir acesso à praia de ninguém. Isso não é permitido, é caso de polícia, caso aconteça”, afirma o Senador em um trecho extraído de suas redes sociais (CONFIRA AQUI).

Porém, o  Advogado Geral da União, Luís Fernando, que também é mestre em Ciências Ambientais pela Universidade Federal de Goiás, afirma que há um precedente perigoso. Em áudio exclusivo para o Blog Bastidores, ele explica três pontos considerados importantes quando se fala em transferir terrenos de marinha para o domínio privado.

“É importante a gente pensar nas consequências que poderiam haver, uma vez aprovada essa PEC. A primeira, é a questão do acesso às praias. Existe uma garantia constitucional de acesso. Só que na prática ao transferir para domínio privado esses terrenos de marinha a gente pode supor que grandes empreendimentos, condomínios, resorts construídos com domínio pleno sobre terrenos de marinha dificultaria ou até impediria o acesso às principais praias, aquelas mais disputadas porque não haveria local de acesso pela população. Pode haver um impacto negativo causado à população para acessar as praias principais do Brasil. Outro ponto seria também a dificuldade de acesso das populações tradicionais, ribeirinhas, que se valem da pesca artesanal para sua sobrevivência. Por fim, o impacto ambiental que pode causar. Em via de regra, esses terrenos de marinha são terrenos de proteção ambiental. Existem manguezais, restingas e dunas onde vivem espécies sensíveis, são ambientes naturais de proteção contra inundação”, analisa Luís Fernando, confirmando, obviamente, que se a PEC passar, a União deixa de receber pelos terrenos de marinha ocupados.

Como se vê, diferente do lobby feito pelo Flávio Bolsonaro, os riscos de privatização das praias com a aprovação da PEC é real. Ao focar principalmente em fim de “aluguéis” e do pagamento da “taxa do laudêmio”, o Senador tenta jogar uma cortina de fumaça, usando até mesmo a regularização fundiária da favela da Maré, no Rio de Janeiro. No entanto, não fala que, a grande maioria dos ocupantes das áreas são grandes empresários que lucram com seus negócios ou pessoas abastadas donas de mansões a beira mar para o veraneio e que, certamente, tem todas as condições de pagar pelo uso do espaço, assim como um cidadão comum paga pelo aluguel de uma casa ou terreno.

O Senador Flávio Bolsonaro não parece estar focado apenas em geração de emprego. Talvez esteja de olho grande na renda que tudo isso pode gerar para congressistas ávidos por um quinhão dessa terra de marinha, ou melhor, dos empreendimentos atuais e futuros que por ventura venham a tornar-se donos das praias.

Terrenos da marinha no Piauí 

Parnaiba 

4596 cedidos a terceiros e 15 ocupados pela administração pública

Luis Correia 

1068 cedidos a terceiros e oito ocupados pela administração pública

Cajueiro da Praia

479 cedidos a terceiros e dois ocupados pela administração pública

Ilha Grande 

86 cedidos a terceiros e três ocupados pela administração pública

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