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A atriz transformista, jornalista, cantora, escritora, produtora e ativista cultural Safira Bengell foi a convidada do episódio desta semana do A10Cast, podcast da TV Antena 10. Ícone da cultura LGBTQIA+ brasileira, Safira falou sobre sua trajetória, as dificuldades enfrentadas ao longo da vida e sua atual produção artística. Ela também comemora cinco décadas de carreira com o lançamento da biografia “A Arte de Viver” e a estreia do espetáculo "Lê Girls", em cartaz.
Natural do Piauí, Safira conquistou o Brasil e o mundo com sua arte e militância. Ao longo do episódio, compartilhou momentos comoventes e fortes de sua história, desde a juventude até a consagração como referência na cena transformista.
“Eu fui embora para o Rio de Janeiro porque na minha condição eu era muito além do aquém, tive que sair. Porque senão, naquele período, era deserdada da família. Eu tive que procurar um lugar que pudesse ter paz. Quando cheguei lá, tinha uma prima que falou que eu não podia ficar lá com ela porque eu era muito afeminado. Então fui dormir debaixo das árvores, nas praças, nos bancos das igrejas, mas estava feliz da vida porque estava livre, saí do casulo”, disse Safira, relembrando sua chegada ao Rio na década de 1970.
No podcast, Safira contou também sobre as violências físicas e psicológicas enfrentadas na infância e adolescência.
“Pra mim foi muito difícil... era ficar ajoelhada em caroço de milho por meia hora, era palmatória; tudo isso para desistir de querer ser mulher. Fui para o Meduna levar choque, disseram que eu era doida. Doida por querer ser mulher, mas eu já era mulher, eu sempre fui, mas nasci no corpo errado. Eu tive que ir para o Meduna, estavam procurando todas as maneiras para que eu fosse um doutor, um rapaz, mas nunca tive esse perfil masculino. É muito doloroso, mexe com o psicológico. As pessoas querem e vão querer que você seja aquilo que elas querem. Isso é um desrespeito”, desabafou.
Safira também explicou como surgiu o nome artístico que hoje é marca registrada e recordou os primeiros passos nos palcos do Rio de Janeiro.
“A Safira surgiu lá no Rio de Janeiro, com a necessidade de trabalhar, de ganhar dinheiro. Eu me identifiquei com a Maria Alcina. Colocaram um macacão transparente em mim, três penas na cabeça e 'vai!'. Eu fui e dali pronto. Eu não sabia qual nome seria, perguntaram meu signo e a pedra de Gêmeos era a safira. Naquele período, as mulheres tinham nome próprio tipo Esmeralda. Eu fui a primeira Safira brasileira artista. As outras são genéricas depois de mim. Depois fui atuar em teatros, musicais. Eu gostava muito da Norma Bengell, primeira brasileira mulher a fazer nu artístico. Então coloquei meu nome Safira Bengell”, contou ao A10Cast.
A experiência profissional e o comprometimento com a arte também foram destaques na entrevista. “Nós éramos profissionais, carteira assinada, figurino, ensaiava por meses. Tinha todo esse profissionalismo que até hoje carrego comigo. Minha grande fortuna é ter tido essas experiências profissionais e me tornar a marca e produto Safira Bengell no mercado com credibilidade.”
Ela também relembrou um dos episódios mais emblemáticos de sua vida, quando foi presa por se vestir como mulher durante a ditadura militar. “Também fui para São Paulo, onde fui presa por me vestir de mulher. Isso na época da ditadura. Rasgaram meus documentos, saí nos jornais com o título ‘travesti pede melhores condições para seus colegas de trabalho’. Eu sempre fui uma ativista cultural, sempre lutei pela minha categoria, pelo coletivo. Tem que ser assim, porque aí vamos criar mais possibilidades de trabalho”.
Apesar de todo o preconceito, Safira sempre levou o nome do Piauí com orgulho para os palcos e projetos sociais, inclusive fora do país.
“Eu já fui voluntária da Unicef italiana, que trabalha com políticas a favor das crianças. Fiz filmes, teatros, espetáculos, era a ‘rainha da noite’, televisão... Eu sou muito simples, as pessoas não imaginam o que eu fiz e construí trazendo o nome de Teresina e Piauí. Eu mereço o título de patrimônio imaterial”, explicou.
Com uma mensagem de humanidade e dignidade, Safira finalizou o episódio com palavras fortes e cheias de significado. “Meu pai dizia assim: respeite para ser respeitada. Eu sigo à risca. Eu sou uma pessoa, eu não sou diferente, não sou um extraterrestre, sou uma pessoa com dignidade, que respeita o próximo, o meio ambiente. Sou uma pessoa comum, eu acho que tem que ser assim. Civilizada, uma pessoa que você tem que conviver, respeitar. E assim você consegue. Eu sou um trator, eu amo viver, amo a vida”.
Atualmente, Safira Bengell está em cartaz com o espetáculo "Lê Girls", que conta a história das primeiras transformistas brasileiras no teatro e na televisão.
“O espetáculo conta a história das primeiras transformistas brasileiras no teatro e na TV e eu fiz parte. O espetáculo Lê Girls traz essa história com o cenário virtual com fotos antigas, traz todas as personagens do preto e branco. Agora, nessa etapa, vamos passar para o colorido, época dos bares gays do Rio de Janeiro, e vamos também para os concursos de beleza”, finalizou.
Fonte: Portal A10+