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A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) continua nesta terça-feira (21) o julgamento do chamado “núcleo de desinformação” da trama golpista ocorrida no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro.
A sessão está prevista para começar às 9h e pode se estender até 19h. No início, os ministros vão analisar questões preliminares do processo, como alegações de incompetência ou suspeição. Na sequência, eles votam se condenam ou absolvem os sete réus que fazem parte desse núcleo.

Antonio Augusto/STF
Os réus desse grupo são:
- Ailton Moraes Barros (ex-major do Exército);
- Ângelo Denicoli (major da reserva do Exército);
- Carlos Cesar Moretzsohn Rocha (presidente do Instituto Voto Legal);
- Giancarlo Rodrigues (subtenente do Exército);
- Guilherme Almeida (tenente-coronel do Exército);
- Marcelo Bormevet (agente da Polícia Federal); e
- Reginaldo Abreu (coronel do Exército).
Esse grupo foi acusado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) de espalhar notícias falsas e atacar instituições e autoridades.
Os réus respondem por tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
Como foi o primeiro dia
O julgamento desse núcleo começou na última terça-feira (14), com a leitura do relatório (resumo do processo), as sustentações orais da PGR e as manifestações das defesas dos réus.
Na sustentação, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, responsável pela acusação, afirmou que a conduta dos réus do grupo, por meio de uma campanha de desinformação, culminou para “o desfecho violento de 8 de Janeiro de 2023″.
Segundo Gonet, os réus elaboraram e disseminaram narrativas falsas contra o processo eleitoral e os poderes constitucionais, impulsionando uma instabilidade social que levasse a uma ruptura institucional.
O chefe da PGR destacou que Marcelo Bormevet e Giancarlo Rodrigues usaram de forma indevida a estrutura estatal para disseminar ataques infundados ao sistema eleitoral e às autoridades.
Os dois, segundo a acusação, integravam a chamada Abin (Agência Brasileira de Inteligência) Paralela, criada sob coordenação do então diretor Alexandre Ramagem, e funcionavam como uma central de contrainteligência para monitorar opositores e difundir desinformação. Ambos também produziram e divulgaram informações falsas sobre ministros do STF.
Em relação a Ângelo Denicoli, Gonet afirmou que ele teve papel relevante na tarefa de “barbarizar o sistema eletrônico de votação”, transformando narrativas sem fundamento em dados aparentemente técnicos e confiáveis.
Após as eleições de 2022, Denicoli teria intensificado sua atuação, prestando suporte técnico a ataques falsos e participando da produção de mídias e documentos que sustentavam a narrativa de fraude eleitoral.
O procurador-geral apontou que Carlos Cesar Moretzsohn Rocha foi responsável por dar aparência técnica a dados manipulados, usados para contestar o resultado das eleições e sustentar a tese de vitória de Jair Bolsonaro.
O relatório produzido sob sua direção teria deturpado informações de forma deliberada, sendo utilizado para justificar “medidas extraordinárias antijurídicas”. A PGR afirma que Rocha tinha plena ciência da falsidade dos dados, e que seu trabalho foi essencial para legitimar a tentativa de golpe.
Guilherme Almeida foi acusado de disseminar massivamente conteúdo falso, utilizando sua formação em cibernética e experiência no Comando de Operações Terrestres para mobilizar civis e militares. Segundo a PGR, ele incitou abertamente a violência e pregou a necessidade de “sair das quatro linhas” para invadir o Congresso e forçar uma intervenção militar.
Gonet também acusou Reginaldo Abreu de tentar interferir no relatório das Forças Armadas sobre o sistema eleitoral, buscando alinhá-lo a dados falsos fornecidos por estrangeiros. Abreu teria sugerido a Jair Bolsonaro que mantivesse reuniões apenas com o núcleo disposto a agir fora da legalidade — grupo que ele chamou de “rataria”.
O procurador-geral ainda afirmou que Ailton Moraes Barros exerceu papel central nas pressões contra comandantes militares que resistiram à tentativa de golpe. A partir de ordens do general Walter Braga Netto, ele teria coordenado ataques virtuais e físicos contra os chefes das Forças Armadas classificados como “traidores”.
Defesas alegam falta de provas e pedem absolvição
Os advogados dos réus sustentaram a ausência de provas de autoria, dolo específico e nexo de causalidade entre as condutas descritas e os crimes atribuídos pela PGR. Em comum, todos afirmaram que os réus não integraram organização criminosa e não tiveram participação em atos de natureza golpista.
A defesa de Giancarlo Rodrigues sustentou que ele não cometeu crime e não teve intenção de participar de qualquer trama golpista. A advogada Juliana Malafaia argumentou que Rodrigues apenas cumpria ordens dentro da Abin. Também negou que ele tenha criado ou difundido fake news, afirmando que apenas encaminhou uma notícia que julgava verdadeira.
O advogado de Guilherme Almeida, Leonardo Avelar, afirmou que a acusação se baseia em suposições e que as provas demonstram a inocência do réu. Avelar destacou que Mauro Cid, delator da investigação, negou qualquer ligação de Almeida com grupos golpistas e confirmou que ele não participou de planejamento ou execução de ataques.
A defesa de Marcelo Bormevet afirmou que não há relação causal entre suas ações e os crimes descritos. O advogado Hassan Souki disse que Bormevet apenas repassou informações públicas e não criou qualquer conteúdo falso. Também sustentou que as condutas atribuídas ocorreram antes do período citado na denúncia e que ele não fazia parte de uma estrutura organizada, conhecendo apenas um dos demais acusados.
No caso de Reginaldo Abreu, o advogado Diego Marques afirmou que as provas se baseiam em mensagens extraídas do celular de terceiros, sem garantia de autenticidade. Argumentou que as conversas, embora “infelizes”, foram retiradas de contexto e não demonstram intenção golpista. Disse ainda que não há prova de que Abreu tenha tentado interferir em relatórios das Forças Armadas.
A Defensoria-Pública da União, que representa Ailton Moraes Barros, defendeu que não há provas suficientes para condenação. O defensor Gustavo Zortea afirmou que Barros não executou ordens do general Braga Netto nem manteve contato com os oficiais supostamente pressionados. Disse que as postagens do réu em redes sociais tinham caráter de “marketing político” e que as mensagens citadas pela acusação são isoladas e sem valor probatório.
O advogado de Ângelo Denicoli, Zoser Araújo, pediu a desconsideração de fatos acrescentados pela PGR e disse que as provas não indicam vínculo entre seu cliente e a organização criminosa. Argumentou que o acesso de Denicoli a documentos de estrangeiros ocorreu após as publicações das supostas fake news e que sua participação no Instituto Voto Legal foi apenas técnica, sem envolvimento político.
O advogado Melilo Dinis, que representa Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, defendeu que o réu atuou de forma estritamente técnica ao elaborar relatórios do Instituto Voto Legal. Disse que ele nunca afirmou haver fraude nas urnas e que suas análises foram legítimas e amparadas em contrato com o Partido Liberal.
Confira os crimes de que os réus são acusados
- abolição violenta do Estado Democrático de Direito: acontece quando alguém tenta, “com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. A pena varia de 4 a 8 anos de prisão.
- golpe de Estado: fica configurado quando uma pessoa tenta “depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”. A punição é aplicada por prisão, no período de 4 a 12 anos.
- organização criminosa: crime cometido por quem promove, constitui, financia ou integra, “pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa”. Pena de 3 a 8 anos. A organização criminosa consiste em “associação de 4 (quatro) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos, ou que sejam de caráter transnacional”.
- dano qualificado: destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, com violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima. Pena de seis meses a três anos.
- deterioração de patrimônio tombado: destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial. Pena de um a três anos.
Fonte: R7